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Neurocirurgia pode reduzir gravidade de tiques provocados pela Síndrome de Tourette

Neurocirurgia pode reduzir gravidade de tiques provocados pela Síndrome de Tourette

Aos sete anos, Vitor Emanuel Farias da Silva foi diagnosticado com Síndrome de Tourette. Ele morava com a família em Coronel Vivida, no Sudoeste do Paraná, e até a adolescência passou por diversas fases da doença à medida que os sintomas se alternavam e se tornavam mais intensos. Tiques múltiplos involuntários, motores e vocais, piscar os olhos, franzir a testa, balançar a cabeça, bater objetos, tossir, fungar, além de gritos e espasmos frequentes e inúmeros internamentos fizeram parte da vida de Vítor, que concluiu o Ensino Médio, mas não conseguiu fazer vestibular. Ser um portador da Síndrome de Tourette, que ainda hoje é pouco conhecida, impactou severamente a vida social do garoto, que agora tem 18 anos.

“Uma vez, ele ficou quatro dias seguidos gritando e tendo espasmos, dia e noite. Mesmo tomando medicamentos, ele não conseguia dormir”, conta a mãe de Vítor, Marli Luiz da Silva, 50 anos, lembrando o período em que o filho não queria sair do quarto porque sentia medo, vergonha e insegurança de se relacionar com as pessoas. “Ele não queria tomar banho nem ver ninguém. Falava o tempo todo que queria morrer, justamente porque essa síndrome traz junto muitos outros ‘gatilhos’, como os sentimentos decorrentes de ser negado a ele o direito da convivência social. Existe muito preconceito. Ele já foi até expulso de uma panificadora na nossa cidade em função dos tiques, porque as pessoas olham torto e não querem dividir o mesmo espaço com ele.”

Após uma piora acentuada dos sintomas nos últimos três anos, mesmo com uso de medicações, no mês de março deste ano, Vítor foi submetido a uma neurocirurgia para implante de um dispositivo de Estimulação Cerebral Profunda (DBS) no Hospital INC (Instituto de Neurologia de Curitiba). A cirurgia pode ser um dos tratamentos para a doença e fortaleceu na família a esperança de que a Síndrome possa ter um maior controle. “Ele ainda tem os tiques, mas ocorrem de forma mais espaçada. Sabemos que é um processo lento, pelo menos 90 dias para começarmos a ver resultados. Estamos muito felizes e ele já está mais animado, quer sair de casa, descer do carro, conversar com algumas pessoas. Ele viu que os tiques podem melhorar com esse tratamento, com as terapias, e que nós estamos apoiando ele em tudo. Isso é muito importante”, relata Marli.

Centro de tratamento de alta complexidade
A Síndrome de Tourette é uma desordem neuropsiquiátrica que não tem cura, mas que pode ser controlada buscando a redução da intensidade dos tiques e monitoramento das sensações premonitórias e, assim, diminuir os sintomas que causam desconforto e comprometem a funcionalidade, além dos prejuízos para a autoestima e aceitação social do paciente. Alguns dos tratamentos com este objetivo são a terapia comportamental cognitiva (tratamento de reversão de hábitos) e o uso de medicamentos antipsicóticos.

Para os pacientes com Síndrome de Tourette refratária, ou seja, que não respondem aos medicamentos, pode ser indicado excepcionalmente o tratamento neurocirúrgico funcional com Estimulação Cerebral Profunda (DBS) aplicada em áreas específicas do cérebro. Vários estudos têm mostrado que o DBS pode ser eficaz na redução da gravidade dos tiques nesses casos. “O tratamento com neurocirurgia para esta doença é raro. Essa é segunda cirurgia feita aqui no hospital neste alvo que é chamado de Globo Pálido Interno, e numa área mais posterior e medial do Globo”, informa o neurocirurgião Dr. Murilo Meneses, pontuando que, desde 2000, o Hospital INC realiza implantação de DBS para outras doenças, como o Parkinson.

Cerca de quatro meses após a cirurgia, Vitor apresenta uma redução significativa dos tiques motores e vocais Para facilitar o acompanhamento médico, a família se mudou para Curitiba em abril. “O que nos deixou animados é que, logo após o procedimento, o paciente ficou sem tique, mesmo com o aparelho desligado. Isso significa que implantamos o DBS no local exato, aumentando as expectativas de alcançar melhoras dos sintomas no Vítor, gradativamente”, explica o neurocirurgião, lembrando que a indicação dessa cirurgia requer uma avaliação multidisciplinar e deve ser feita em um centro especializado de tratamento.

A cirurgia consiste na implantação de eletrodos em cada lado do cérebro (no circuito cerebral afetado pela doença) e de um gerador no tórax que emite estímulos elétricos – que vão sendo regulados. Dessa forma, a intenção é controlar os sintomas do Tourette para dar mais qualidade de vida ao paciente.

Síndrome é de difícil controle
Doença mais comum em meninos e cujos sintomas começam a se instalar ainda na infância e adolescência (antes dos 18 anos), a Síndrome de Tourette é de difícil controle e ainda tem causa desconhecida. Os sintomas podem piorar com estresse e também estar associados aos sintomas obsessivo-compulsivos (TOC), ao distúrbio de atenção com hiperatividade (TDAH) e aos transtornos de aprendizagem. Embora menos frequentes, os sintomas mais conhecidos da síndrome são os que envolvem o uso involuntário de palavras (coprolalia) e gestos (copropraxia) obscenos, a formulação de insultos e a repetição de um som, palavra ou frase dita por outra pessoa (ecolalia).

Agora, além de buscar qualidade de vida para o filho, Marli conta que o seu desejo é ajudar outras famílias que convivem com essa doença. “Vou continuar levantando essa bandeira, ajudar a divulgar essa síndrome. Eu sei que em Coronel Vivida tem mais casos e em outras cidades da região. É triste ver que as famílias não sabem como ajudar, levam em curandeiro e dizem ‘que é espírito’, porque a pessoa anda na rua gritando e falando ‘palavrões’. São tantos que estão trancados no quarto, sem receber um tratamento adequado, porque eles têm vergonha de sair de casa e a família também.”

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